Para uma melhor compreensão
As datas sempre tiveram importância na vida das pessoas e isto se percebe há muito tempo. Festividades e comemorações são oportunidades de conhecimento de nossas origens. É por isto que escrevemos estas linhas que seguem.
Há pouco celebramos uma festa sesquicentenária, ou seja, os 150 anos de realização da Festa de Nossa Senhora da Conceição e da inauguração da Igreja Matriz de Ipueiras que à época do primeiro festejo era uma simples capela. O registro destas informações nos foi legado pelo Pe. Francisco Felipe Fontenele, vigário de Ipueiras, por meio de anotações recebidas do ipueirense Hugo Catunda Fontenele que foram registradas no Livro de Tombo da paróquia.
Em 1867, data da primeira realização da Festa da Padroeira, Ipueiras não era mais uma grande fazenda e sim um pequeno vilarejo com poucas casas ligado à Vila Nova do Ipu Grande que já tinha esse nome por ser reconhecido como um pequeno centro urbano daquela época. Entretanto, a sede da paróquia (que chama-se freguesia) era a Matriz de São Gonçalo da Serra dos Cocos desde 30 de agosto de 1757 (fora criada por Dom Francisco Xavier Aranha, bispo de Pernambuco). Esta freguesia da Matriz de São Gonçalo era enorme e abrangia toda esta região próxima de Ipueiras.
Como a sede da vila era o Ipu e a Igreja Matriz ficava no povoado de São Gonçalo, aos poucos a comunidade religiosa foi, por diversos fatores arrefecendo, o que culminou com a ida do Pe. Francisco Corrêa de Carvalho e Silva para o Ipu. A Igreja Matriz ficou praticamente abandonada o que terminou mais tarde com a supressão da freguesia.
Na época imperial o Brasil vivia sob o regime do padroado que consistia num acordo de cooperação entre a Igreja Católica e o Império brasileiro no qual o governo imperial podia nomear os vigários por meio de concursos e propor nomes de bispos, o que seria confirmado pela Santa Sé. Por outro lado, ao receber o dízimo, o responsável pela manutenção das freguesias, de suas igrejas e de seus vigários também era o Império, enquanto a Igreja se preocupava com a formação do clero e por meio deles à fomentação da vida de fé dos fiéis.
Neste contexto, por proposição do Deputado Provincial Pe. Francisco da Mota de Souza Angelim, a Assembleia Provincial do Ceará decreta e o Presidente da Província Sátyro de Oliveira Dias (com cargo equivalente nos nossos dias ao de governador), sanciona a Lei Provincial nº 2036 de 25 de outubro de 1883 criando o município de Ipueiras e dois dias depois, em 27 de outubro é sancionada a Lei Provincial nº 2037 cujo projeto também era do Pe. Angelim e que extinguia a Freguesia de São Gonçalo da Serra dos Cocos e criava as freguesias de Nossa Senhora da Conceição em Ipueiras e a de São Sebastião de Ipu. A antiga matriz ficou subordinada à nova Igreja Matriz de Ipueiras, conforme é até hoje. Como vigorava o padroado, faltava ainda a confirmação da Igreja Católica.
Em 21 de abril de 1884, quase seis meses depois da instituição civil/legislativa, Dom Joaquim José Vieira, recém empossado segundo bispo do Ceará, institui canonicamente a Freguesia de Ipueiras por meio de uma provisão passada no Palácio Episcopal em Fortaleza. Naquela época o Ceará inteiro constituía uma única e grande diocese com sede na capital.
Agora pode surgir uma dúvida: tendo a Paróquia de Ipueiras duas datas de criação (27 de outubro de 1883 e 21 de abril de 1884), por que só se comemora uma delas e mais precisamente a última?
Bem, vivemos politicamente num regime republicano e o padroado não vigora mais. Então nada mais justo do que reconhecer como aniversário oficial a data de criação canônica, pois quem detém ordem na hierarquia da Igreja são seus legítimos pastores, neste caso os bispos. Inclusive cabe ressaltar que o primeiro pároco de Ipueiras foi nomeado por Dom Joaquim e a paróquia só foi definitivamente instalada quando o Pe. João Dantas Ferreira Lima tomou posse em 06 de julho de 1884, poucos dias antes do falecimento do Pe. Angelim, que foi pelo novo padre assistido com os sacramentos antes de morrer em 18 de julho de 1884.
Esperamos ter ajudado na compreensão dos fatos citados e contamos com as orações de todo o povo fiel para que as bênçãos de Deus derramem-se em abundância sobre a terra da Imaculada.
PARA FACILITAR A LEITURA
- Joaquim José Vieira: nasceu em Itapetininga-SP aos 17 de janeiro de 1836 e foi o segundo bispo do Ceará de 1884 a 1912. Zeloso administrador, defensor da doutrina e moral católicas e grande empreendedor, constituiu a Diocese do Ceará de bom aparato estrutural. Seu nome é muito conhecido pela Questão de Juazeiro e seu entrave com o Pe. Cícero Romão Batista. Faleceu em Campinas-SP em 08 de julho de 1917.
Livro de Tombo: conforme as orientações eclesiásticas, toda paróquia deve manter registro de suas principais atividades pastorais e até de eventos sociais importantes. Assim, fazer o tombamento das informações significa registrar no livro de tombo os eventos mais significativos.
Padroado: Acordo de cooperação entre a Igreja Católica e o Império brasileiro que vigorou até a Proclamação da República em 1889.
Pe. Francisco Corrêa de Carvalho e Silva: nasceu em Aracati-CE aos 10 de dezembro de 1814. Foi ordenado em Olinda-PE aos 21 de dezembro de 1841. Exerceu por 38 anos o ofício de Vigário da Matriz de São Gonçalo da Serra dos Cocos. Era considerado um grande intelectual. Faleceu em Ipu-CE aos 13 de junho de 1881.
(Texto produzido com informações do Livro de Tombo da Paróquia de Ipueiras e do Prof. Francisco de Assis Melo, de Ipu)
Marcos Augusto de Freitas Costa
Licenciando em História pela Universidade Estadual Vale do Acaraú-UVA e agente de pastoral na Paróquia Nossa Senhora da Conceição de Ipueiras-CE.